As estruturas ligamentosas, que são as mais fortes do corpo, se localizam anteriormente e posteriormente, contribuindo para a estabilidade da articulação. Na articulação e nos ligamentos circundantes existem termina- ções nervosas capsuladas e não-capsuladas, fazendo da articulação sacroilíaca uma possível fonte de dor. Na parte posterior, a articulação recebe ramos das divisões posteriores de L4 a S3 e, na parte anterior, de L2 a S2.
Esta inervação dá como resultado um padrão de referência de dor que é complexo e, de modo geral confuso. A articulação é envolvida por músculos potentes que não têm nenhuma influência direta no movimento da articulação, mas podem interferir na mobilidade da mesma. O debate a respeito da mobilidade da sacro-iliaca remonta à época de Hipócrates. Hoje, é consenso quase geral que existe uma mobilidade, porem de pequena amplitude. Falando em favor da mobilidade, nós temos a natureza sinovial do compartimento inferior aliada às alterações degenerativas que aparecem na articulação. Este movimento é mais significativo nas mulheres durante a gravidez e a menstruação, devido aos efeitos da relaxina na resistência e na rigidez do colágeno. As variações relacionadas com a idade, tais como a ancilose periarticular e as alterações nas superfícies articulares, fazem a mobilidade da articulação diminuir com o tempo. As articulações sacroilíacas podem ser envolvidas em diversas patologias. O diagnóstico pode ser feito pelo quadro clínico da doença em questão, pela presença de dor e pelos resultados das análises de laboratório e de estudos de imagem. As espondilatropatias soronegativas, mais especificamente a espondilite ancilosante, são exemplos típicos de patologias que afetam as articulações sacroilíacas. Neste grupo de doenças, o sacroilíaco pode ser afetado muito antes de ser notada alguma
alteração na espinha. Raramente a espondilite precede a sacroileíte. O raio X pode ser normal na fase inicial destas doenças, ao passo que a tomografia computadorizada aumenta a possibilidade de detectar alterações precoces. É possível obter resultados melhores com a ressonância magnética, que pode ser ainda mais sensível quando feita com contraste. Nesta situação, a cintilografia óssea tem valor duvidoso. As alterações degenerativas que geralmente começam ao redor dos quarenta anos são mais comuns nos homens, mas podem ser assintomáticas, como acontece com outras articula-
ções. Na fase inicial, as diferenças entre as alterações degenerativas e sacroileíte inflamatória são difíceis de distinguir através do raio X. Mais tarde, a formação de osteófitos periarticulares também pode ser confundida com ancilose intra-articular das espondiloartropatias, mas a tomografia computadorizada ajuda a esclarecer estas dúvidas. A artrite reumatóide pode afetar a articulação sacroilíaca na fase avançada da doença. A sacroileíte gotosa é mais comum na gota tofácea grave e pode ser bilateral. A doença causada por deposição de cristais de pirofosfato de cálcio, assim como a sarcoidose, ocronose, hiperparatireodismo, doença de Paget, osteomalacia, acromegalia e outras patologias podem afetar as articulações sacroilíacas.
Os tumores primários são raros. A sinovite vilonodular pigmentada, que é mais comum em crianças, pode ser acompanhada de uma destruição óssea considerável. As lesões metastáticas estão associadas mais freqüentemente com câncer de pulmão, de mama, de rim e de próstata. Infecções são incomuns na articulação sacroilíaca. O germe mais comum é o estafilococo, mas convém lembrar das Pseudomonas no sacroilíaco infectado de um viciado em drogas. Foram relatados casos de tuberculose bilateral. A cintilografia óssea podeser útil para diagnosticar sacroileíte infecciosa. Os praticantes de corrida e os recrutas militares podem apresentar fraturas por tensão no sacro, no íleo ou em ambos, e as fraturas por insuficiência são uma complicação da pelve osteoporótica. Mais uma vez, a cintilografia óssea pode ser útil no diagnóstico destas duas enfermidades. Finalmente, a osteíte condensante do íleo é uma doença benigna que aparece nas multíparas jovens, muito embora também tenha sido apresentada por homens. A doença é caracterizada envolvimento bilateral e assintomática ao longo da parte ilíaca inferior da articulação e, analisada por raio X, pode ser confundida com sacroileíte de espondiloartropatias. No entanto, o quadro clínico e a tomografia computadorizada ajudam a esclarecer qualquer dúvida no diagnóstico diferencial. Todavia o que ainda pode ser polêmico e até não ser aceito por alguns autores, é a condição conhecida como: disfunção do sacroilíaco, síndrome da articulação sacroilíaca ou articulação sacroilíaca mecânica.
Esta terminologia é usada para caracterizar uma anormalidade da articulação sacroilíaca em que haveria um distúrbio biomecânico, sem nenhuma lesão aparente. No entanto, às vezes existe uma cintilografia óssea positiva, o que levanta a possibilidade da presença de alterações inflamatórias. A prevalência desta doença varia conforme a bibliografia consultada, sendo maior nas fontes quiropráticas e osteopáticas. O padrão de dor de uma articulação sacroilíaca foi determinado injetando contraste intra-articularmente em voluntários saudáveis. Com maior freqüência, a dor se localiza abaixo do território do L5 (estando a área mais específica a Teste de Gillet: O paciente fica
Teste de rotação do quadril: O paciente se deita em posição supina, com os maléolos mediais se tocando mutuamente. A posição dos maléolos mediais do lado a ser testado é determinada em relação ao maléolo medial oposto. A perna do lado testado é abduzida e girada externamente até o seu máximo. Em seguida, a perna é devolvida à posição neutra. Normalmente, o que se espera é um alongamento aparente da perna do lado testado. Este fenômeno é explicado por movimentação da espinha ilíaca anterior superior, que se desloca para baixo à medida que o quadril é girado externamente. Quando há disfunção de articulação na articulação sacroilíaca, a defesa de proteção da musculatura que há sobre a articulação sacroilíaca impede o deslocamento caudal do íleo e não ocorre este alongamento aparente.
Teste supino/sentado: Com o paciente na posição supina, é medido o comprimento de cada membro inferior. O paciente é solicitado a se sentar. Havendo um alongamento aparente de um dos membros, isso poderia sugerir uma disfunção do sacroilíaco.
O histórico médico e os testes físicos mostraram ter validade limitada na disfunção do sacroilíaco. Os testes também estão sujeitos um erro grande, de um observador para outro. Os testes tambem dependem da habilidade e da experiência do examinador. Os testes provocativos são capazes de tensionar outras estruturas, além das articulações sacroilíacas. A obesidade pode dificultar a determinação das referências apropriadas. A presença de distúrbios estruturais, tais como escoliose e verdadeira discrepância no comprimento dos membros inferiores tornam a interpretacao dos testes de mobilidade mais difícil.
O bloqueio diagnóstico foi apresentado como o teste padrão para provar se a dor vem da articulação sacroilíaca. O princípio é simples. Se um anestésico local for introduzido corretamente dentro da articulação e se a dor desaparecer ou diminuir consideravelmente por um tempo compatível com o tempo de ação da medicação, muito provavelmente a fonte de dor é a articulação (um alívio da dor de pelo menos 50% em uma escala analógica visual é desejável). Como acontece em todo bloqueio diagnóstico, uma resposta falso positiva é um problema. Para evitar esta questão, alguns autores propuseram um bloqueio em dois momentos diferentes, usando anestésicos locais com tempos de ação diferentes. Inicialmente o paciente recebe um bloqueio com lidocaína e, se sentir alívio da dor, recebe uma segunda injeção de bupivacaína que provoca um alívio que deveria durar mais do que o primeiro bloqueio. No passado os bloqueios eram executados às cegas, o que os tornava pouco confiáveis. Atualmente, estes bloqueios são feitos com fluoroscopia ou tomografia computadorizada. Para gestantes poderia ser usada a ressonância magnética. O uso de contraste também é importante para confirmar a posição da agulha dentro da articulação e para mostrar que não há absorção vascular do anestésico (fenômeno que resultaria em uma resposta falso-negativa). Idealmente, o bloqueio deve ser feito por alguém que não está tratando do paciente, a fim de evitar distorções. A quantidade de contraste injetada é 1 cm3 e a de anestésico local é 2 cm3. Distúrbios de coagualacoa e infecções são contra-indicações para os bloqueios. No entanto, como o bloqueio é feito no aspecto sinovial da articulação, não se deve excluir a possibilidade de a dor ter origem em ligamentos, músculos e no compartimento não-sinovial. O tratamento da disfunção do sacroilíaco também é um assunto discutível. As opções preferenciais de praticamente todos os médicos são a correção da discrepância verdadeira do membro (se houver), antiinflamatórios não-esteróides, e fisioterapia. Os osteopatas, os quiropráticos e os terapeutas manuais advogam o uso da manipulação e mobilização, que podem ser associadas com medicação e fisioterapia. A fisioterapia está focalizada em um programa de exercícios para corrigir desbalanço muscular. O glúteo máximo e o médio, e os rotadores externos do quadril devem ser fortalecidos. Os ileopsoas, rectus femoris e jarretes são submetidos a alongamento. Usa-se manipulação e mobilização na tentativa de restaurar a mecânica da articulação. Alguns dos defensores dessas duas modalidades alegam que elas diminuem a subluxação. Para diminuir a instabilidade podem tambem ser usadas cintos pelvicos, principalmente
Outro tipo de terapia que vem sendo usada na disfunção do sacroilíaco é a proloterapia, que consiste em injetar substâncias esclerosantes (tais como dextrose e fenol) na parte ligamentosa da articulação. Isso estimularia a produção de tecido ligamentoso mais rígido e mais abundante, resultando em mais estabilidade. No entanto, alguns autores acreditam que a resposta terapêutica à proloterapia se deve a uma neurólise química de ramos das divisões posteriores que inervam o aspecto posterior da articulação. A termocoagulação por radiofreqüência dos ramos mediais das ramificações posteriores é uma modalidade terapêutica que vem sendo usada no tratamento da síndrome da faceta cervical e lombar. Este procedimento também vem sendo usado por alguns médicos no tratamento da disfunção do sacroilíaco. Nesta situação, a ablação é feita em ramos das divisões posteriores L5 até S2. No entanto, este método não pode ser direcionado para inervação do aspecto anterior da articulação. Neuroestimulacao faz parte do arsenal terapêutico usado no tratamento das dores cronicas crônica e pode ser usada na forma de um estimulador elétrico transcutaneo (TENS) ou por implante de eletrodos epidurais. Na dor sacroilíaca, o TENS pode ser associado a outras modalidades tradicionais. Existem relatos de casos de uso de eletrodos colocados no espaço epidural do sacro para o tratamento da disfunção do sacroilíaco, quando esses casos não responderam a uma abordagem mais conservadora. A viscossuplementação com produtos semelhantes ao ácido hialurônico é um tratamento novo para a osteoartrite. Existem relatos de resultados encorajadores no tratamento de osteoartrite do joelho. Na literatura há poucos casos de pacientes com possível disfunção do sacroilíaco e que aparentemente reagem bem a este tipo de tratamento.No tratamento da disfunção do sacroilíaco, a artrodese deve ser reservada para os casos intratáveis e incapacitantes. Finalmente, como acontece em outras síndromes dolorosas crônicas, alguns pacientes poderiam ser tratados com analgésicos opióides, mas convém levar em conta os problemas de tolerância e depedencia psicologica.
CONCLUSÃO
A articulação sacroilíaca é uma fonte potencial de dor. Com que freqüência a disfunção do sacroilíaco provoca dor lombar é outra questão. Este quadro pode ser confundido e coexistir com outros distúrbios. Na ausência de outras patologias tais como discopatia, síndrome da faceta lombar e doença do quadril, a historia e o exame médico podem ser suficientes para fazer o diagnóstico. No entanto, em caso de dúvida, pode ser necessário o uso de anestesico intraaricular para se confirmar o diagnostico. Se o tratamento conservador não fizer efeito, o médico deverá procurar outras opções, mas também deve ter em mente a falta de estudos prospectivos controlados destas modalidades invasivas.
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